Costuma-se creditar o 08 de Março a um único evento: a morte de 129 operáriAs em uma fábrica de tecidos nos Estados Unidos em 08/03/1957. A pesquisadora Diana Assunção (do Coletivo Pão e Rosas do Brasil, criado em 2009) cita outros fatos históricos, que destaco: 1) Em 1910 Clara Zetkin (feminista alemã) propôs que trabalhadorAs de todos os países organizassem um dia de luta, especialmente pelo direito ao voto, durante II Conferência Internacional das Mulheres em Copenhague/Dinamarca. 2) Em 1911 um incêndio na fábrica de tecidos Triangle Shirtwaist (em Nova York) matou 146 trabalhadores, sendo 125 mulheres (de 13 a 23 anos), fazendo com que o histórico Sindicato International Ladies’ Garment Workers’ Union (União Internacional de Mulheres da Indústria Têxtil) fortalecesse a luta por melhores condições de trabalho; 3) Em 08/03/1975 mulheres saíram às ruas pedindo pão e paz em Petrogrado (hoje São Petersburgo) – essas mulheres exigiram a saída da Rússia da Primeira Guerra Mundial e tiveram um papel central no estabelecimento de um dia de comemorativa e de lutas das mulheres. 

Naquele 1975, a ONU oficializou o 08 de MARÇO como o Dia Internacional da Mulher. Desde então, vê-se um crescimento da romantização da data, sendo comum haver homenagens às trabalhadorAs, bem como matérias jornalísticas com destaque às mulheres que ocupam cargos normalmente ocupados por homens, fatos que distanciam o real sentido: a luta das mulheres por respeito e igualdade. No Brasil, a realidade das mulheres pode ser classificada como cruel, pois as violências ocorrem a cada minuto, das mais graves às mais leves. 

A experiência de uma MULHER NEGRA traz muitos desafios, especialmente para quem é estudada (como diziam minhas avós!) e vive em uma sociedade  racista, machista e classista, como indica a Dra. Zélia Amador (Professora da UFPA referência em estudos de gênero e raça). Assim, é possível afirmar que no Brasil a maioria dos homens não suportam mulheres inteligentes e odeiam as intelectuais. Estas sofrem violências diferenciadas e quase nunca percebidas, especialmente no ambiente de trabalho onde são adjetivadas de forma negativa por homens e mulheres machistas, constando exclusão de processos políticos (de representação de classe) e de equipes de trabalho (por serem uma ameaça aos que não têm conhecimento científico) – violências institucionalizadas. Os estudos sobre gênero levam a observação de que a agressividade masculina é latente, bastando que mulheres se manifestem para sofrerem violências. A exemplo, em um dos grupos de whatsapp de trabalho que participo, homens adjetivaram mulheres com conhecimentos acadêmicos  em diversas áreas como: descompensada, brigona, terrorista, especuladora, narcísica, burra, louca (este com direito a objetificação e indicação de psiquiatras à servidorA), intelectual de metro quadrado, dentre outros. 

Para além do ambiente de trabalho, são muitas as violências contra mulheres comprovadas nos dados oficiais – cito alguns deles: 1) O Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou que em 2022 mais de 18,6 milhões de mulheres sofreram algum tipo de violência, ou seja, a cada minuto 35 mulheres foram agredidas (mais de 50% sofreu violência em casa, 65% são negras e mais de 50% têm menos de 34 anos); 2) O Fórum também divulgou que somente no primeiro semestre de 2022 foram 699 vítimas de feminicídio (média de 04 mulheres mortas por dia!); 3) O IPEA divulgou que ocorrem 822 mil estupros por ano e que apenas 8,5% são registrados na Polícia e apenas 4,2% das mulheres têm atendimento no sistema de saúde; 4) Segundo dados do Governo Federal sobre gravidez infantojuvenil, a média de partos de meninAs com até 14 anos é de mais de 20.000 por ano. Os dados oficiais apresentados indicam que SER MULHER NO BRASIL É VIVER SOB O RISCO DE MORTE, de forma constante.

A narrativa sobre violências “sutis” nos ambientes de trabalho foram apenas exemplos que ocorrem diariamente e que não estão contabilizadas nas estatísticas oficiais. Considerando tais narrativas e os dados oficiais, a conclusão é de que não há o que ser comemorado, pois a violência contra UMA mulher é uma violência contra TODAS as mulheres. É preciso resgatar o verdadeiro sentido do 08 de MARÇO. Assim, não a flores e chocolates e sim a conscientização da luta pelo direito a uma vida livre de violências, da luta contra o machismo que propaga ódio contra o feminismo, um movimento social (de todos: mulheres e homens) que lutam por igualdade de gênero e pela paz social.

Finalizando, reforço o entendimento de Chimamanda Ngozi Adichie (premiada escritora nigeriana, cujas produções são importantes às questões de violência de gênero e para romper com visões colonialistas): SEJAMOS TODOS FEMINISTAS. Boas reflexões a todAs, todEs e sobretudos a todOs.

Rosivane S. Mendes
FiliadA do SISEMPPA desde 2008 / Integrante do MPPA desde 1997 / Integrante do Coletivo de Mulheres FENAMP-ANSEMP desde 2021
DoutorA em Ciência Política pela UFSCar/SP
MestrA em Planejmento do Desenvolvimento pela UFPA
Especialista em Gestão Pública / Especialista em Direito do Estado
Pós-graduada em Direito Agrário e Políticas Públicas
Pós-graduanda em Direitos Humanos no PPGDH/UFPA

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